quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Ruga


Não pega, Jose. Mas ela vai lá e pega. Pega goiaba do vizinho sem que ninguém veja e faz suco gelado com bastante açucar pra gente beber. Hmmmmmm. Jose diz que passou a madrugada no Posto de Urgência. Sinusite é uma coisa bem comum na sua família. A irmã Bruna, a baixinha despirocada que também já cuidou de mim, e deixava meus cabelos tão bonitos com a sua habilidade de fazer trança embutida, morreu de fraqueza, morreu de descuido. Então, Jose teve que esperar com seu marido até 1h da manhã. Os dois plantonistas se ocupavam com três ou quatro homens que levaram facada de mulher. Ela ficou com medo de voltar tão tarde pra casa, visto que os morros estão em guerra. Pessoas estranhas vêm de fora. Ela disse que um quer tomar o morro do outro. E todo mundo tem que ficar quieto. Tiroteio.
A mãe da Jose sempre vem aqui. Dona Ângela, mulher gorda e enrugada, carregada de sotaque, sem muitos dentes, passeia com os 10 netos pela cidade de charrete, como se o Sol escaldante fosse apenas um item decorativo do espaço. Um dia Dona Ângela fugiu de casa, nós a vimos passando na rua, de cabelo molhado e mochila nas costas. Confirmado o ato no dia seguinte, por alguém que passou l'em casa, fiquei imaginando o estado de liberdade daquela mulher cansada. O seu deslocamento despreendido dos impecilhos: casa, marido, filhos, netos. Será que ela sabe que já envelheceu? A vida pesou tanto, tanto, tanto, que fez ela desistir de tudo. Quero ser como Dona Ângela e fugir com a minha charrete.

Nenhum comentário:

Postar um comentário